terça-feira, 31 de março de 2009

D. NUNO ÁLVARES PEREIRA, O NOVO SANTO DE PORTUGAL

Que aureola te cerca?
É a espada que, volteando,
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.

A pergunta de Fernando Pessoa é simultaneamente a resposta do Poeta na versão camoniana da Mensagem, um dos livros portugueses mais válidos da Literatura Portuguesa do século XX.

Cremos que a citação é oportuna no momento em que o Vaticano acaba de anunciar a canonização de D. Nuno Álvares Pereira como Santo – mais um entre os de Portugal, onde sobressai o Santo António de Lisboa, que os italianos pretendem ser de Pádua, o que também está certo, considerando que a vida espiritual só começa quando se deixa a vida terrena.

Nascido no dia 24 de Junho de 1360 (em Sernache do Bonjardim, Sertã – dizem alguns historiadores), D. Nuno morreu em Lisboa, no Convento do Carmo, que ele mandou fazer e foi em boa parte destruído pelo terramoto de 1755 – e até hoje não restaurado! ). Atribuem-lhe muitos milagres mas os 3 primeiros pertencem à História de Portugal, quando, com um reduzido número de lusitanos, comandou e venceu o enorme exército castelhano nas batalhas de Atoleiros (08-04-1384), Aljubarrota (14-08-1385) e Valverde (2-10-1385).

Ao colocar-se ao lado do Mestre de Aviz, D. Nuno foi não só nacionalista mas também patriota destemido. Por isso, D. João I o nomeou Condestável do Reino, título que o Povo enobreceu ao vitória-lo como "Santo Condestável", após a carreira brilhante e tão poderosa que ele julgou consolidar a Independência de Portugal e se retirou das lides militares, vestindo os trajes humildes de Frei Nuno Álvares Pereira, apesar da sua ascendência aristocrática.

São inúmeros e bem documentados os estudos sobre o grande sedimentador da Independência Portuguesa, relevando-se a Crônica do Condestável de Portugal (por Fernão Lopes) e A Vida de Nun’Álvares (de Oliveira Martins), pode salientar-se que a ação de D. Nuno Álvares Pereira, se foi decisiva para o bom fim da crise política dos anos 1383-1385, após a morte do Rei D. Fernando (22-10-1383) e a ascensão ao trono de Leonor Teles (aquela que traiu o marido legítimo para se tornar Rainha e, depois traiu Portugal, quando tentou entregar o poder ao genro (o rei castelhano D. João I) isto é, ao maior inimigo da soberania portuguesa. Foi então que se levantaram contra a traição D. Nuno e outros fiéis aquele que viria a ser o Rei dos portugueses, D. João I.

Derrotadas as ambições imperialistas do rei de Castela, D. Nuno consagrou-se definitivamente à acção religiosa e dos seus triunfos militares ficou para sempre o belíssimo Mosteiro da Batalha, que é ainda hoje uma das mais belas jóias da Arquitetura de Portugal de todos tempos. Entretanto, D. Nuno Álvares Pereira tornou-se frade carmelita em 15-8-1423, após entregar os seus bens à família e aos pobres, salientando um historiador que, dedicando-se ao "serviço absorvente de Cristo", prodigalizou tão somente "actos de piedade e de benemerência", conforme testemunha o último título que recebeu do povo lisboeta – o de Santo Condestável.

Passaram os anos e os séculos – os portugueses queriam –no santificado pelo que fez pela Nação, com particular destaque pelo auxílio aos desafortunados. Começaram a rezar ao "Santo" que ele ainda não era, conforme as leis da Igreja, mas ele já estava santificado por milhares de amigos que pediram ao Papa Urbano VIII (em 1651) que Frei Nuno fosse beatificado, pedido renovado ao Papa Clemente X em 1674, mas o culto ao Santo Condestável só foi proposto pela Sagrada Congregação dos Ritos pelo Papa Bento XV: e em 23-1-1918 o Vaticano reconheceu Beato da Igreja Católica Apostólica Romana e pôde, enfim, ascender aos altares.

Seguiu-se o processo de santificação, que é sempre demorado e somente foi reaberto em 13-7-2003 – só faltando reunir alguns documentos, que foram remetidos ao Vaticano em 2004 pelo Vice-Postulador , Padre Francisco e encaminhados pelo Prefeito da Congregação da Causa de Todos os Santos – o Cardeal português D. José Saraiva Martins.

Finalmente, a santificação virá com o Sumo Pontífice Bento XVI neste ano de graça de 2009! E agora urge repor inteiro o poema Nun’Alvares Pereira. De Fernando Pessoa:

"Que aureola te cerca?
É a espada que, volteando,
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.
Mas que espada é que, erguida,
Faz esse halo no céu?
Excalibur, a ungida,
Que o Rei Arthur te deu.
Sperança consummada,
S. Portugal em ser,
Ergue a luz da tua espada
Para a entrada se ver! " (**)

(**) O Poeta Fernando Pessoa sugeria que fosse mantida a ortografia original dos poemas de Mensagem (1ª. edição, Lisboa, 1934). Por isso, leia-se: "S. Portugal" = "São Portugal".

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